By Cristiano Jerônimo | 2009 |
Candeias | In the artist's house
Sem alardes, Luiz Augusto Martins Côrtes, 60 anos, o pernambucano Lula
Côrtes, canaliza toda a sua hiperatividade (e haja Ritalina) para produzir,
diariamente, pinturas de óleo sobre telas, gravuras de lápis dermatográfico
sobre papéis canson e vergê, contos, poemas e músicas. Ainda sobra tempo para
dar aulas de pintura gratuita, como faz há mais de oito anos. Seu enraizamento
com o litoral do município de Jaboatão dos Guararapes – onde há 16 anos reside
de forma itinerante no triângulo Piedade/Candeias/Barra de Jangada – e a sua
referência artística no município (Lula já recebeu várias homenagens, entre
elas o título de Cidadão Jaboatonense) fez com o prefeito eleito Elias Gomes o
nomeasse para o cargo de Gerente de Cultura da Prefeitura, onde trabalha ao
lado de Ivan Lima Filho. Mas, engana-se quem pensa que Lula Côrtes se resume a
Jaboatão, Recife, Pernambuco. Há pouco tempo, ele foi capa e figurou nas
páginas centrais da maior revista mundial do show business: a Rolling Stone
(ver fotos). Ao lançar o luxuoso e arrojado livro-conto O Lobo e a lagoa, em João Pessoa (PB), foi
capa de todos os jornais e matéria de página inteira dos cadernos de cultura
(ver fotos). Em reconhecimento ao seu trabalho literário, no final do ano
passado, ainda sob a presidência do poeta Vital Correia de Araújo, a União
Brasileira dos Escritores de Pernambuco (UBE/PE) deu-lhe a carteira de sócio
efetivo, retroagindo a ano de admissão a 1972, quando o multiartista lançou seu
primeiro Livro das Transformações.
Na ocasião, foi homenageado. Em 2008, ficou no topo das paradas de sucesso de
World Music nos Estados Unidos, com o relançamento mundial (por gravadoras da
Inglaterra e dos EUA) dos discos Paêbiru, Satwa e No Sub
Reino dos Metazoários (com homenagem a Marconii Notaro).
Atualmente,
divide-se e desdobra-se nas muitas tarefas que escolheu e outras que o mundo
lhe deu. Canta com os Bluestamontes
Blues Band e a Má Companhia (sua fiel escudeira há 18 anos) e está gravando o
CD triplo Tarja Preta, o qual define como “um tratado sociológico sobre a
juventude atual, divido em três comprimidos (discos) à base da substância ativa
lula córtex”, brinca. Confira, na íntegra,
a longa e polêmica, só pra variar, entrevista concedida por Lula Côrtes ao
jornalista e escritor Cristiano Jerônimo, em seu apartamento, na beira mar da
Barra de Jangada, quase dentro do mar. Não poderia faltar neste bate-bola, os
clássicos episódios psicodélicos e surrealistas da vida do cantor, artista
plástico e escritor. E mais, revelações surpreendentes da época do regime
militar.
Cristiano
Jerônimo: Como foi o lançamento do seu livro o Lobo e a lagoa em
João Pessoa , na Paraíba?
Lula
Côrtes: O lançamento foi maravilhoso, numa fundação maravilhosa, na praia do
Cabo Branco. O auditório tinha 250 lugares e os 250 estavam ocupados. Até os
corredores estavam cheios.
Aonde foi,
Lula Côrtes, o lançamento?
Na Fundação Casa de José Américo, na Paraíba, dia 12 de novembro.
Lotou com
250 pessoas. Como é que foi a divulgação?
Foi a produtora de Ronaldo Mendes, hoje secretário de Turismo de lá,
justamente o cara que foi meu primeiro produtor; meu e do Zé Ramalho. Ele foi
quem fez o trabalho do começo da carreira da gente. Então quando eu fui fazer a
matéria e a filmagem (o repórter da Rolling Stone, Cristiano Bastos, está
fazendo um filme sobre o disco Paêbiru) para a
revista, na Pedra do Ingá (PB), o Ronaldo Mendes nos recebeu e deu apoio.
Ele é secretário
de Turismo de João Pessoa ou do Estado?
Da Paraíba. Aí foi quando falei do livro, ele convidou para fazer o
lançamento lá.
Você foi
capa de todos os jornais da Paraíba. Na sua opinião, será que aqui em
Pernambuco, este mesmo lançamento, renderia uma capa de cultura?
Não, não renderia nada não. Ninguém
dá nada não.
Nem pela
importância cultural que você tem, de ser pernambucano e de ter várias
vertentes artísticas?
Eu acho que isso não interessa muito a Pernambuco não. Eu acho que o “Movimento
Cultural” de Pernambuco está voltado pra um monte de caras que vivem
trabalhando com as secretarias de cultura, com as leis de incentivo à cultura,
que dizem que incentivam a cultura (Nesta entrevista, Lula ainda não tinha
começado a trabalhar com Elias Gomes e atualmente, com o prefeito eleito,
acredita que é possível oxigenar a cultura de Jaboatão dos Guararapes). Então
eles (produtores) vivem mais pra incutir falsas idéias na cabeça dessas pobres
pessoas que estão começando aqui. Entendeu? De que eles não são nada. De que
eles que estão ligados à prefeitura é que podem. De coisas desse tipo: que são
tudo e que vão dar todos os canais pra ele, desde que eles dêem a alma, o
trabalho e o dinheiro pra eles. Entendeu? Então Recife anda pra trás por isso.
Você chega em qualquer lugar e as coisas tem outra conotação. Entendeu? Isso eu
já falei em tantas vezes, em tantas entrevistas que eu acho que é por isso,
talvez, que eu não toque nos lugares e que eu nem precise mais disso. Porque é
uma coisa tão clara, tão notória, que eu não sei como é que essas pessoas não
caem. É um tipo de crime isso. É um crime contra a inocência dos
Você se
refere a quê? Claro que precisa citar nomes...
Me refiro à obrigatoriedade
de qualquer coisa que se faça aqui ter que se fazer através de esmolas da
prefeitura, de esmola de leis de incentivo à cultura que pertencem a uma panela
que nós todos sabemos dos nomes.
O que
precisava aqui na tua opinião?
Eu acho que precisava de uma limpeza, precisava de Ajax, um furacão branco, se é que existe. São pessoas viciadas que
mudam de governo pra governo, sem ideologia, sem coisa nenhuma. Mas que estão
ali agregadas à prefeitura, usurpando os direitos das pessoas de fazerem arte,
são sub-seres. Entendeu? São os produtores que não produzem nada, os arquitetos
que não arquitetam nada, os escritores que não escrevem. Todos eles estão na
prefeitura do Recife. Essa merda vai ficar assim o tempo todo.
Tem um
tom de desabafo também nisso aí?
O desabafo é eterno. Tem cinco anos que eu falo isso. Aliás, desde o
começo dessas leis. Você veja: em todos os meus trabalhos, eu nunca procurei um
apoio de uma lei dessas de incentivo, porque você vai lá e é a mesma coisa de
você estar conversando com um poder de traficante. O cara vai te dar
oficialmente, você manda seu projeto elaboradíssimo para lá. Se for um projeto
pouco rentável, ele diz que não: “Esse projeto é muito pobre, você precisa
fazer um projeto mais aprimorado pra gente dar uma carga nele”. Eles chamam de “projeto
do caralho” o que vende mais. Eles querem que seja uma média aprovável. Eles
fazem isso, eu não.
Fazem o
quê?
Por exemplo, meu livro custa 20 mil reais. O cara diz: - eu te libero
vinte mil, mas se você me der cinco. Entendeu? O cara vai se virar num livro
que custa vinte mil com apenas quinze mil. Pensando que está lucrando alguma
coisa, vai ficar endividado. Não vai fazer no nível que ele quer, a coisa que
ele queria. E esse alguém vai colocar cinco mil no bolso sem fazer absolutamente
nada. Esses são os representantes da nossa cultura. Isso é um negócio.
Você
convive com essas dificuldades há mais de 30 anos?
Eu não convivo porque eu não me envolvo com eles. Eu vejo isso
acontecer. Eu não entro porque meus trabalhos como você vê, são autofinanciados.
A alternativa sou eu mesmo. Eu vendo meus quadros, pego meu dinheiro e invisto
no que eu quero pra fazer a coisa no nível que eu acho que o povo de Pernambuco
merece.
É por
isso que tu não pára de pensar?
E de fazer, lógico. A Casa da Praia...
(um livro de ficção inédito). O povo de Recife merece um trabalho daqueles. Um
monte de universitários maravilhosos interessados em artes plásticas, gente
informadíssima. Eles merecem ter um livro nas mãos que seja digno que eles
possam levar para a França. É uma coisa internacional que foi feito na terra
deles. Então eles vão ter orgulho de mostrar aquilo. Mas se eu dependesse da
“cultura”, do “negócio da cultura” daqui eu jamais faria um livro no nível que
eu faço. Você está entendendo? Eu preciso de pessoas como Patrícia Lima, como
pessoas da Bagaço (editora), que entram na coisa, arte pela arte, que vão
ganhar o que nós ganhamos. Nós estamos ganhando. Aos trancos e barrancos, nós
estamos ganhando. Mas nós estamos ganhando uma coisa de uma qualidade que
Recife nunca viu.
Mas vamos
voltar a falar do livro O Lobo e a Lagoa...
Eu estou falando exclusivamente sobre o Lobo e a Lagoa. Amanhã às dez horas da manhã, eu tenho uma reunião
com o pessoal da Editora Coqueiro aqui em casa. Estarei editando
A casa da Praia. Um livro não tão
elaborado como O Lobo e a Lagoa, mas de
um conteúdo fino. Um livro com um tratamento gráfico interessante, com um corpo
interessante de você pegar, porque eu busco realizar muito mais do que esse
povo das leis de cultura se propõem a fazer. Sou a favor da lei, mas quando ela
serve para estimular a cultura, mas não enquanto estiverem esses negociantes da
arte ali dentro. Você tem que se ligar, você sabe quem são. Entendeu? Eu
conheço os miseráveis que vivem disso, que vivem da boquinha ali dentro. Estão
fudidos, não são ninguém. Não tem nada pra dar. Só tem pra sugar de nós
artistas.
E essa
questão da panelinha?
A panela é eterna porque eles são impessoais, apartidários. Mudou o
governo, mas eles estão lá. Eles vão lamber o ovo do próximo. Não importa a
bandeira que o outro segure na mão. Importa o quanto ele tem no bolso pra dar a
ele.
Com
relação ao artista, existiria preconceito com determinadas pessoas?
Existe porque tem os coniventes com isso. Tem os que vivem já destes
esquemas. Estão dentro dos esquemas mais caros, dos cachês mais altos. Pessoas
que dão mais alto pra essa máfia. Você está entendendo? É uma máfia. Não tem
outro nome. É uma máfia. É o crime organizado da cultura pernambucana. É isso
que acontece dentro da cultura.
Lei de
incentivo do Recife ou Lei de Incentivo do Estado de Pernambuco?
Do estado de Pernambuco. Não estou falando da Lei Rouanet. Entendeu? Não
estou falando de uma coisa federal. Entendeu? Estou falando que aqui dentro
existe uma manipulação, antiga e está na cara de todo mundo. Todo mundo sabe
quem é quem ali. Entendeu? Então, eles não querem uma pessoa como eu. Não
querem uma pessoa que diga que você não vai ficar com meu dinheiro, esse é o
meu projeto e tal. Eles não vão poder insistir comigo e se sujar comigo, pra
deixar de ganhar dos pobres que vierem depois de mim. E por isso que eu não
procuro essas pessoas. E não tenho nada a ver com a cultura pernambucana. Eu
simplesmente sou pernambucano, eu amo minha terra.
Nada
disso impediu que saísse o seu audiobook O
Lobo e a Lagoa, de excelente qualidade, diga-se de passagem...
Nunca me impediu desde 72, 71. Desde 1969, quando eu fiz o Ávido Vício. A primeira impressão em 69.
Mas não existia esse meio de vida. De uma década pra cá, isso virou um meio de
vida. Compram carro com isso todo ano.
A
estética de O Lobo e a Lagoa, no
ponto de vista do texto, tem alguma influência da escola surrealista?
Eu não sei escrever. Começa aí a história. Então eu comecei a pintar.
Quando eu comecei a escrever poemas e pintar diariamente, eu lia muitas fábulas
antigas, o universo infantil. Na época da minha infância não existia televisão,
então o grande portal pra imaginação vinha da leitura. Como deveria ser até
hoje. Então eu pinto as cenas que eu imagino. Eu pinto com palavras.
No caso de
O Lobo e a Lagoa, você escreve as
cenas que você vê, mas você pintaria?
É justamente isso. Por isso que eu ilustro também. Porque eu procuro
pintar o que eu estou escrevendo e escrever o que eu pinto. Eu toco o que eu
pinto, eu pinto o que eu escrevo e escrevo o que eu toco.
Por que
não lançou O Lobo e a Lagoa aqui em
Pernambuco?
A princípio eu pensei lançar na Livraria Cultura. Mas aí o pessoal da
Cultura queria 45% do meu trabalho. O cara queria ser meu sócio sem me dar
absolutamente nada. Nem um gole de vinho.
Então
isso impediu o lançamento na Cultura?
Eu não estou aqui pra dar de mamar a menino grande. Eu não tenho filho
barbado, que bebe todo dia em restaurante chique, para ganhar 50% do meu
trabalho.
O que
Lula Côrtes está fazendo neste momento, além de dar entrevista, claro?
Um novo livro chamado Retorno ao
Jardim do Éden, além destas telas que você está vendo. Também ensaio várias
vezes por semana e sempre estou me apresentando na noite.
E você vive
da arte que você produz?
É claro. Eu sou Lula Côrtes. Eu pinto, toco e canto. Eu escrevo meus
livros. Isso tem um custo. Um custo que eu tenho que pegar do que eu ganho para
colocar e produzir mais. Se não, já teria parado há muito tempo. São trinta anos
de trabalho, são vinte livros e eu não sei quantos discos, entendeu?
Incontáveis. Mas isso não é conhecido dentro de Pernambuco. Você sabe que todo
meu trabalho foi lançado na América (EUA) pela Time Lags Records e no Reino
Unido pelo selo Mr. Bongo. Um reconhecimento internacional absurdo. Nos Estados
Unidos ficou na parada em décimo terceiro lugar. Você está entendendo? Então
aqui é incapaz de tudo. O pessoal dar uma nota nos jornais... Não pode dar uma
nota nos jornais. Quando os ditos críticos, os historiadores da arte vêm falar
sobre meu trabalho, eles não se dão ao trabalho de vir na minha casa e, depois,
falam absurdos sobre mim. Infundados, sem nenhuma noção de nada do que estão
falando. Em livros, em textos, em revistas importantes tidas como idôneas, de
artes aqui. São pessoas incompetentes que vem falar sobre as coisas sem saber.
Não se dispõem a pegar um ônibus e vir aqui. Eu terei que pegar um ônibus e ir
lá? Eles têm carro lá do jornal. Porque não vem aqui? Dão informação
inverídica, escrevendo merda, dizendo que sou historiador de arte. Não sou
historiador de porra nenhuma.
O
lançamento na Cultura não deu certo. Você pensou em outro espaço para
lançar aqui em Pernambuco?
Não, não, não. Não tenho interesse nenhum em lançar meu livro em Pernambuco.
Mas, e
seu interesse pela Paraíba?
A Paraíba sempre me apoiou nos meus trabalhos. Eu sou o pernambucano
mais paraibano que existe. Entendeu? Mais pela respeitabilidade e a recíproca
que existe na Paraíba, com os trabalhos de artes, com a seriedade que eles
encaram as coisas. Você vai lá e não é tratado como um miserável, que foi lá levar
seu livro pro cara colocar uma nota no jornal. Eles lêem e selecionam o que se
interessam. Dão uma cobertura verdadeira, porque são jornalistas. Aqui não
existe isso. O jornal de Recife não passa de um folheto de anúncios. Isso não é
jornalismo. Isso é de um amadorismo absurdo. De um casuísmo inclassificável. As
pessoas escrevem o que querem sem ter a mínima preocupação de saber se é
verdade ou não.
Lula teu
primeiro livro foi Hábito ao Vício,
em 1969. O Livro das Transformações
foi já na década... (interrompe)
O Livro das Transformações foi
uma terceira abordagem literária. Na verdade, aconteceu na seguinte ordem: primeiro
Hábito ao Vício, que foi um livro
convencional, publicado na Imprensa Universitária. Então veio a Kátia (Mesel,
uma de suas ex-esposas) que era muito criativa. Fizemos um livro chamado Bom era meu irmão... Ele morreu e eu não.
Esse livro era uma caixa, com páginas soltas, com um papel importado maravilhoso,
todo imprenso manualmente por nós dois na Escola de Arte daqui, que era perto
do Sport Club. Cunha era o cara que era o gráfico. Então passávamos à noite
compondo com tipografias. Não existia nada disso de internet, de computadores,
de computação gráfica. Hoje, eu tenho aqui em casa, em CDs, 10 mil tipos
(fontes), 20 mil tipos. Naquela época a gente montava os tipos numa garapéia,
tirando as letras de gavetas, para tirar a primeira prova numa Radio Berg manual (máquina tipográfica
antiga). Foi começo da gráfica no mundo, essa fábrica alemã, a Radio Berg. Tenho uma saudade desta
máquina, era deliciosa. Nós tínhamos adaptado essa máquina com um pequeno motor,
para a gente deixar de fazer o movimento manualmente. Até hoje são as melhores
máquinas de off set. Dessa forma, o livro era uma caixa que tinha uma faixa que
dizia “Consumir é comunicar: rasque!”. Quando o leitor rasgava e tinha uma mola
dentro que espalhava todas as páginas para cima e caia tudo no chão. Aí você ia
apanhar. O leitor montava o seu livro, que tinha passagens absurdas. Você
construía seu livro, Poderia ter vários sentidos.
Tinha influência
psicodélica?
Totalmente. Não é uma influência psicodélica. Ele era o sub-produto do
psicodelismo vigente.
Aqui no Nordeste?
Aqui no Nordeste não. Na nossa cabeça. Porque quando a gente refletia ou
emanava o nosso pensamento aqui, ele também estava presente quando nós
estávamos na Holanda, Portugal, na Espanha, porque na época nós viajamos o
mundo quase todo. Poderíamos estar em qualquer lugar e ele estava na nossa
cabeça. Eu sou hippie.
Eternamente
hippie?
Eu acho que sim, né (sic). Você vê que a minha casa é a casa de um
hippie.
Em
seguida veio este livro Rarucorp?
Este livro tinha umas sacadas de Kátia interessantíssimas. Tinha uma
página que tinha uma sanfona. Você tirava uma dessas páginas, tinha um
envelope, uma tarja, uma brecha que, dentro, tinha comentários nossos do tipo
“ninguém sabe a verdade, aqui de perto, de pertinho”. Tinha “Godard é um chato”.
E assim, se fazia uma crítica sobre tudo o que se vivia na época. Sobre a
chatices, a caretice, a repressão. Tinha páginas em relevo para as pessoas
tocarem e sentirem. Era uma experiência inusitada na época. Então depois disso,
nós fizemos Rarucorp, “procurar” ao
contrário. Era um livro partindo do mesmo princípio. Um livro com 40 centímetros de
tamanho por 15 com espiral. Todo de papel carmem,
esse papel maravilhoso, bem encorpado e de uma cor muito forte. Muito bom graficamente.
É como se fosse um Shüller (papel). Era um papel muito bom para gravura, se
prestava muito para a gravação das impressões. Então, dividimos esse papel espiralado
em três pedaços, mas os poemas eram selecionados e feitos aos pares. Se tivesse
três páginas, teria seis, porque estava impresso do outro lado. Se tivesse
nove, daria 18, e assim
Pernambuco,
Recife, década de 70, conservadorismo, ditadura militar. Como era que vocês
sobreviviam a isso? Literalmente, como sobreviviam a isso?
Sempre é como é eu falo. Agora você vai entender o porquê dessa minha
resistência atual quanto a isso. Porque nós tivemos o primeiro escritório de
artes gráficas daqui. Você está compreendendo? Então nós tínhamos as contas das
maiores firmas daqui. Porque nós tínhamos informações sobre as artes gráficas
que ninguém tinha em
Pernambuco. O primeiro escritório de artes gráficas de
Pernambuco foi nosso. Chamado Plano de Programação Visual. Entendeu? Eu e Kátia
Mesel. Roberto Lúcio trabalhou logo no começo com Kátia antes de eu entrar,
como desenhista de lá. É um grande amigo meu, uma pessoa super criativa.
Roberto
Lúcio atualmente faz o quê?
Roberto Lúcio é um pintor maravilhoso. Uma pessoa que hoje está
pesquisando o universo do abstracionismo, de forma fantástica.
Vocês
faziam design publicitário?
Nós fazíamos design publicitário. Depois que Roberto saiu, nós começamos
a viajar mais no psicodelismo da época, na arte psicodélica. Depois de ir pra
Holanda, e tal. Nós passamos a nos inteirar dessa maneira. Porque não existia
essa maquininha aqui que você pode ir para todo lugar (mostra e bate no
computador). Você tinha que pegar o avião e ir para congressos de artes
gráficas, etc. A gente tinha que explicar para as pessoas o que era a
programação visual. As pessoas ainda faziam placas com 300 tipos diferentes.
Era aquela informação arcaica. Então nós tivemos por conta da Financi La Lumi (sic), que era uma
caderneta de poupança importantíssima daqui, da Johnson & Johnson, fábrica
de fraldas, dos Biscoitos Sagres, do Vale do Siriji, que nós colocamos pela
primeira vez os caras de uniforme padrão, a Kombi e o envelope e a carta que o
cara recebia, tudo tinha a ver.
Vocês davam
uma unidade visual...
A unidade visual. E nós
dávamos verdadeiras aulas disso pra as pessoas. Entendeu? Então isso nos dava
um respaldo financeiro pra gente poder criar independente de qualquer coisa ou
de repressão.
Vamos
fazer a cronologia das obras?
Depois de Rarucorp, veio o Livro das Transformações, que foi a
última parte da Abracadabra (empresa produtora da arte, de Lula e Kátia,
responsável pelos discos Satwa, com Laílson; Marconi Notaro – No sub reino dos
metazoários, com Zé Ramalho, Robertinho do Recife, Geraldo Azevedo, etc.).
Então, paralelo a planos de programação visual, a gente tinha a Abracadabra. Nós
pegávamos o dinheiro que nós tínhamos ganho na empresa e investíamos nas
pessoas que ninguém investiria. Você está entendendo? Exatamente pela
repressão, pelo conservadorismo, toda aquela questão que você me colocou como
pergunta. A nossa forma de romper isso era a gente poder. Um poder abaixo do
poder, mas o nosso poder.
Os
militares achavam que era bobagem o que vocês faziam?
Não, não. Nós incomodávamos bastante. Incomodávamos bastante porque a
postura militar da época era repressiva, violentíssima. Eles tinham muito medo,
além de que eles não estavam preparados para dominar o país. As pessoas se
alistavam aos 18 anos de idade, mas era gente que vinha do interior do país.
Eram pessoas ignorantes. Então, eles queriam dar poder para essas pessoas. E
você sabe que o poder, mesmo para pessoas que estão preparadas, modifica os
homens. Imagine o poder na mão de um ignorante? Então esse foi o grande
prejuízo para o país. Porque o poder estava nas mãos dos ignorantes. A sub-raça
era militar. Os homens que não tinham nada, que não estudavam, iam para a
carreira militar. Todos nós éramos obrigados, aos 18 anos, a servir ao
Exército. Quem ficava lá era sub-raça, quem não tinha nenhum objetivo de vida.
Mas sub-raça
não é um termo forte pra ser usado?
Termos fortes são as metralhadoras que colocaram na minha boca, na
cabeça dos meus filhos dormindo na rede. Isso é termo forte. Palavras não ferem
bandidos. Só balas é que ferem bandidos. Tudo o que eu disser sobre eles é
pouco diante do que eu passei. Diante do que o Brasil passou em termos de
humilhação, em termos de usurpação dos seus direitos de ir e vir, de viver, de
pensar, de tudo. Você está entendendo? Qualquer tipo de palavra usada contra
essas pessoas é pouco. Torturadores, bandidos, criminosos, ignorantes, avessos
à humanidade, à sociedade. Porque eles não sabiam de nada. Eles vinham do
interior e o cara dava para eles autoridade de entrar na sua casa, a qualquer
hora e estuprar e queimar a vagina da sua mulher com o charuto. Atrás das armas
que eles nem sabiam nem pra quê. Atrás de uma coisa que eles chamavam de
comunismo, que nada mais era do que um povo em uma busca de sua liberdade de
expressão, de um querer que nós tanto insistimos e até conseguimos da
democracia. Tudo, qualquer coisa que neles não entendessem era uma atitude
comunista. Qualquer frase que eles não entendessem era obscena. Entendeu? Eles
não sabiam nem ler, na maioria.
Como eram
os shows naquela época?
Os shows eram censurados da seguinte maneira: tínhamos que mandar as letras
em três vias, cantar e não falar nenhuma palavra no palco. Qualquer coisa que
você falasse e não tivesse mandado para a Polícia Federal, era subversão. Você
tinha obrigação de dar um camarote no teatro para a Polícia Federal, que estava
lá pra lhe prender. Eu fui preso não sei quantas vezes. Eu fui preso de uma
maneira que o relações públicas da Polícia Federal disse: Lula, pelo amor de
Deus, você falou isso mesmo? (risos). Eu estou rindo aqui agora, mas eu não
tenho motivo nenhum para rir. Pelo contrário, ver pessoas próximas a mim serem
extremamente torturadas, que nunca mais vão esquecer essas marcas.
Voltando
a sua cronologia artística, literariamente falando, houve um hiato entre o Livro das Transformações e este O Lobo e a Lagoa? Ou escrever as letras
das músicas é uma forma de literatura?
É sim. Porque sempre as músicas vem de um bloco de escritos. Nunca é assim:
escrever uma letra para a música. Hoje, eu estava trabalhando numa música aqui
à tarde, com Rico e Érick. Eu fiz uma limpeza na minha gaveta e resolvi pensar
sobre tudo o que tinha feito na minha vida, o que tinha deixado de fazer, como
eu conduzi a minha vida. Uma coisa intimista minha. Quando Rico chegou aqui,
para acertar umas coisas do show que eu fiz com o Bluestamontes, no Vapor 48. Então
eu disse: - “Rico, estou pensando umas coisas tão fortes, tão absurdas sobre
mim, sobre minha pessoa. Eu falo essa coisa toda. Parece que eu tenho até uma
força qualquer, sabe, para falar isso? Mas não. Eu estou dizendo para você: eu
sou uma pessoa extremamente frágil por conta disso. Entendeu?”.
Por conta
de quê?
De tudo isso que aconteceu. Eu fico sempre na defesa. Porque até hoje eu
tenho medo. Às vezes. Não todo dia. Às vezes as sombras do passado me atordoam
de uma tal maneira que quando toca a campainha da minha casa eu me sobressalto,
tenho taquicardia.
Você se
refere ao regime militar?
Exatamente. Até hoje.
Você
musica as letras ou você faz as letras para a música?
Eu, às vezes faço, as letras para a música, como foi com Gracinha Teles na
Paraíba, recentemente. Gracinha é uma amiga minha, produtora fantástica. Eu
escrevo o que dá na cabeça na hora. Escrevo compulsivamente todos os dias da
minha vida. Às vezes pego um texto que me interessa, aquele assunto aí eu pego
aquele texto e musico ele. Eu dou um compasso, uma métrica pra ele para que ele
caiba numa harmonia. Entendeu? E isso vira música. Às vezes. Não sempre. Por
exemplo, Tarja Preta é um tratado
sociológico sobre a situação atual. Então ele é um trabalho diário. Ele é sobre
o crack, sobre o crime, sobre o homossexualismo, sobre o emo. Tem Emocrise, que eu estou escrevendo
(cantarola um trecho). Eu tenho seis filhos, todos adultos, e essa minha
relação intensa com eles me faz ficar sempre próximo com tudo o que está
acontecendo. Inda mais porque eu toco à noite. Eu cutuco as pessoas o tempo
inteiro. Toco para todas as tribos. Eu toco com eles, escrevo pra eles, eu ouço
as músicas deles, eu dou opinião, eu faço capas. Entendeu? Eu nunca parei isso,
desde o começo da minha vida.Então se você for ver os discos todos que eu tenho
participação são cinqüenta. Tá entendendo? Até agora, eu canto Heavy Metal com Canibal. E componho Bossa Nova com Gracinha, faço forró com Dominguinhos. Gravei com
Vates e Viola, Guadalupe, Teca Calazans, Elba Ramalho, Alceu Valença, Zé
Ramalho.
Houve um
hiato musical entre 1974 de livros e de discos até 80?
Não, porque nos anos 80 eu gravei Rosa
de Sangue.
Aí você
tinha gravado em 74, Paebirú?
Eu gravei em 74, Paebirú. Depois,
eu fiz o Festival com Alceu, Molhada de
Suor, o Tema dos Coronéis,
daquela novela Gabriela Cravo e Canela,
da Rede Globo. Foi muito instrumental, muita coisa experimental.
Você
acompanhava a banda de Zé Ramalho, tocando tricórdio? Não, não.
Acompanhei a banda de Zé Ramalho não. Ao contrário, Zé Ramalho tocava comigo.
Eu nunca toquei na banda de Zé Ramalho não. O trabalho que eu fiz com Zé foi
ele trabalhando comigo. Depois Zé conheceu Alceu através de mim. E nós dois
fomos tocar com Alceu no Trem de Catende.
Está entendendo? Nós dois fomos tocar na banda de Alceu Valença, o Trem de Catende que tem no Festival Abertura.
Então esse foi o tempo, o tempo que passou sem disco.
Aquele
tricórdio de Chão de Giz, foi uma partipação que você fez?
Não. É uma composição minha
com ele. Nós tocávamos muito juntos viola e tricórdio. Então aquela música é a
única do disco que é só viola e tricórdio. Entendeu? Depois quando ele foi
gravar na CBS aí se colocou mais arranjos. Mas, basicamente, ele é tricórdio e
viola. Nós fizemos muitas composições, baseadas no tricórdio e viola. Depois
ficamos tocando muito ainda. Ele fazendo o trabalho dele e eu o meu. Depois eu
toquei no disco dele. Tive no primeiro disco de Alceu (Valença), no Molhada de Suor. Depois é que veio o de
Zé Ramalho, que foi depois do Rosa de
Sangue, que eu fiz o disco Avôhai,
que tem Chão de Giz, Noite Preta.
Para o
disco Rosa de Sangue, você foi
contratado?
Não. Rosa de Sangue foi o meu último disco independente. Depois de Rosa de Sangue, eu fui contratado pela Ariola.
Então eu fiz LP O Gosto Novo da Vida.
Eu tive um problema com a Ariola, porque a Rozemblit (antiga gravadora
recifense de discos) disse que eu tinha gravado Desengano com eles. É como eu sempre digo: Recife. Eu nunca vi um
movimento mais bonito do que o mangue. Porque eles são exatamente caranguejos. Andam
para trás, puxam os outros e acaba todo
mundo no buraco, na lama. É a cara de Pernambuco.
Mas
voltando ao foco da literatura, vamos falar um pouco de poemas?
Eu estou dizendo assim: é que depois que eu fiz o meu disco na Ariola, vendi
32 mil cópias num mês. Eles (os donos da Rozemblit) detestaram aquilo. Então
eles tinham que inventar alguma merda para atrapalhar o fluxo natural da
história. Então o que eles disseram? Eles disseram que eu já tinha gravado
aquilo. Eles brigaram três anos com Ariola, perderam a causa, logicamente, e eu
fiquei prejudicado por esses três anos. Paralelo a isso, eu fiz o Oxigênio com Lazzarini (maestro), o
Terreno Baldio (banda). Um disco interessantíssimo, que foi uma produção
independente, mas gravado no estúdio maravilhoso da Transamérica, em São Paulo. Um
arranjo maravilhoso com um naipe de metal, mais o trabalho do Terreno Baldio e
mais o maestro Lazzarini. Depois disso, eu fiz vários trabalhos, fiz Bom
Shankar Bolenath, com Jarbas Mariz (1988). Antes, fiz Nordeste, Cordel e Canção. Gravei 60
horas com Zé Ramalho, quando registramos , pela primeira vez, a dupla Caju e
Castanha, lá em Apipucos. É o que tem na abertura do primeiro disco de Lenine.
Aquele Caju e Castanha que tem lá, ele tirou exatamente do nosso disco, embora
não faça nenhuma alusão a isso. Também fiz a trilha do filme de Sérgio Ricardo
(A Noite do Espantalho),
interessantíssimo. Fiz o cenário, Kátia (Mesel) o vestiário. E eu, Robertinho
do Recife, e o pessoal fizemos a trilha (Alceu e Geraldo Azavedo estavam como
atores). O filme foi todo filmado em Fazenda Nova. Eu
acho que nunca teve hiato. Eu acho que houve um momento que não estava
publicando, mas sempre produzindo. Eu estou fazendo agora um documentário de
Ana Patrícia, super interessante. Fiz a trilha sonora do filme de Kátia, O Rochedo e a Estrela. A trilha foi
dividida em três partes. Um filme que trata da fundação de Manhatan, da
expulsão dos holandeses daqui de Pernambuco. No final, uma coisa dos judeus
atuais em Mannhatan. Houve
uma pré-estreia com a trilha sonora. É um filme muito interessante para quem
gosta de história.
Você fez
trabalhos com Zé da Flauta?
Zé da Flauta participa de duas ou três faixas. Na verdade, são 46 temas
gravados no estúdio de Zé da Flauta. Então, Zé é uma pessoa cooperativa,
paciente, criativa. Um grande criador. Eu conto com ele para tudo. A trilha do
meu livro O Lobo e a Lagoa foi
gravada paralelamente à do Rochedo e a Estrela.
Voltando
a falar em O Lobo e a
Lagoa, faz tempo que você tinha o livro preparado. Como foi possível uma tiragem de apenas 300
exemplares numa qualidade gráfica tão elevada?
Todo o trabalho de criação gráfica é de Patrícia Lima. Todas as
ilustrações (em aquarela) são minhas, da capa e do miolo, mas
a idéia do formato nós tivemos juntos. Patrícia Lima é uma artista gráfica
fantástica. Mas eu estou pensando em lançar o livro mais surpreendente que o
Brasil já viu, o Livro da Luz.
Como é
este livro tão surpreendente?
É o primeiro catálogo do Sexo das
Plantas (série de quadros que Lula pinta há anos sobre os aparelhos
reprodutores das flores, sementes e frutos). Acompanha texto e toda a história
dessa vertente dos Atípicos (outra
denominação para o Sexo das Plantas).
Sua
pintura se intercala entre muitas escolas, mas tem sempre uma coisa muito de
plantas, desde a capa que você desenhou para o álbum LP de Marconi Notaro, No
Sub Reino dos Metazoários.
Desde Juiz de Fora (Lula morou com os avós mineiros quando perdeu os
pais), eu já tinha feito uma apresentação toda de óleo, só de atípicos,
psicodeslimo puro. Mas a primeira manifestação, Página dos Sonhos, foi em 1977. Eu morei sozinho. Eu sempre tive
uma coisa de pintar paisagens. Depois veio a coisa do surreal. Os atípicos
tiveram vários momentos. Veio a Página
dos Sonhos, depois Organismos de uma
Natureza Inexistente, depois Sexo das
Plantas 1, 2, 3 que é uma pintura independente.
Pintas
uma média de quantos quadros, quantas telas?
Eu pinto todos os dias. Eu escrevo todos os dias. Eu estou lançando o
meu outro livro Aparição (permanece
inédito). O que eu estou escrevendo agora é o Retorno ao Jardim do Éden. Mas, estou escrevendo ainda...
O livro A Casa da Praia conta a história de um
psicopata... Inclusive o pósfácio foi escrito pela minha
co-terapeuta, quando eu estava internado e tive o acompanhamento dessa mulher
maravilhosa, doutora Mônica. Ela escreveu um estudo sobre o estado patológico
dos personagens. Muito interessante, como se eles existissem de verdade.
Você pode
contar um pouco da história?
É a história de um cara que é um caseiro de um escritor e cuida dos
barcos dele. Então ele se apaixona pela mulher do cara e quer matar o cara. Então
ele arma uma trama de afrouxar umas tábuas e tal e sabotar o barco. Ele sabe
pelo rádio que vai ter uma tempestade e propõe ao cara para sair e experimentar
as velas, pois sabia que as tábuas iriam se soltar e ele naufragaria lá no meio
da tempestade.
O resto
não conta.
Aí o caseiro chama o patrão, que estava com a mulher, a irmã da mulher e
com os filhos. Ele queria que apenas o patrão fosse velejar, mas eis que foi a
família inteira. O escritor fazia questão que todos fossem. Não havia como o
caseiro dizer que não. Todos confiavam muito nele. Ele era uma pessoa
maravilhosa, embora fosse esquizofrênico. Todo mundo foi para barco e todos
morrem, menos o escritor, que sabia nadar muito, e é recolhido por uma escuna
pesqueira de bacalhau, que tem que fazer o roteiro previsto para depois levar o
sobrevivente para casa. Neste tempo em que o escritor estava no mar, o caseiro
estava na casa dele, vivendo como ele. E é provocado pela esquizofrenia dele e
pela máquina de escrever para contar a história, que estava perturbando ele. Então,
ele sempre se vê entre uma máquina de escrever, cujo teclado é o mar, e
mergulha as mãos no mar e confessa tudo aquilo que fez. Mas, paralelo a isso,
ele vai vivendo como o cara e começa uma série de assassinatos absurdos. Aí eu
não posso chegar ao fim. Sei que as coisas começam a partir daí (risos).
Influência
literária. Qual a leitura que você tem como referência?
Edgar Alan Poe, Mister Ibidem,
Stephen King.
Mas essas
referências não
influenciam diretamente nas letras das suas músicas.
No conteúdo não, mas na forma de construir sim. Não nas letras de
música, mas nos livros, nos contos.
Você estudou
Realismo Fantástico, também não foi?
Eu dei uma pincelada sobre tudo. Eu leio sobre tudo. Eu estudo sobre
tudo até hoje.
Dizer uma
escola (estética) para Lula Côrtes é complicado?
Eu acho que fico bebendo de todas as fontes. Eu consigo fazer uma mescla
desse misticismo absurdo, da alta magia, com a coisa da magia sertaneja, e o
fato de ter morado lá me dá essa facilidade de descrever as paisagens, de
pintar as minhas histórias. Eu acho que eu pinto o agreste muito bem. Eu
conheço muito o agreste, vivi muito lá. Eu gosto muito de andar à cavalo, de
criar gado, entendo tudo de bode, entendo de cerca, de bicho.
Entre o
Livro das Transformações (1972)e o Lobo e a Lagoa (2008), existem outros livros?
Entre o Livro das Transformações e o Lobo e a Lagoa...
Ou você
se dedicou muito mais às artes plásticas?
Às artes plásticas e à
música. Eu escrevi muita coisa, mas não publiquei. Eu ganhei prêmio
Nenhum comentário:
Postar um comentário