segunda-feira, 18 de julho de 2022

Visão púbere da intermitência da água

 


Os ninhos dos casacas-de-couro nos caminhos

São incontáveis diversões na janela do ônibus

Que ninho? De onde saem os belos passarinhos

Aquela ânsia de chegar em casa de verdade e rir

Era um tempo em que estava dentro da floresta

E outro momento fatal que me pôs pra fora dali

Mas eu fui, eu resisti, linha de frente nas lavouras

Lembro hoje dos cabelos brancos do meu bisavô

Minha madrinha imaculada filha de escravos

Benzedeira de tirar doença, sono e mau olhado

Meus padrinhos, meu Pai Avô e minha Mãe Avó

O inocente tido como doido já deve estar no céu

Penso no encontro com cada um desses amores

Para além da vida cotidiana e das nossas dores

Um engenho moendo cana, rapadura à direita

A fornalha queimando à esquerda a farinhada

As produções eram festas no mel da moenda

De onde vem é inóspito e parece esturricado

Numa área em processo de desertificação

Casas fechadas, janelas abertas do abandono

E da mulher que espera seu marido há 20 anos

Viúva da seca, o marido botou outra em seu lugar

Nos invernos, a água faz florestas na caatinga

Água o dia inteiro e o medo constante de acabar.

 

 

(Cristiano Jerônimo – 10.07.2022)


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